sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Carla e o óculos - Próxima Parte


 
Carla achou que finalmente tinha feito algo certo, esperado. Engano seu, ao sair do consultório ouviu reclamações do tipo como não tinha nada, me fez perder tempo em te trazer até aqui, como falou as letras certinho, como?? Como?? Como?? Ela toda sem graça, mas pensando que esse seria ainda o correto disse que decorou. A briga ficou maior, decorou?? Mas que absurdo, ninguém decora plaquinha com letra. Onde já se viu fazer um negócio desses, perdeu a consulta. Carla não entendeu nada, já não sabia se era para falar certo ou errado. Se era bom ou ruim para sua mãe que ela usasse óculos. Não soube qual seria a maneira de acertar.
E, os anos passaram, Carla continuou com dificuldade no aprendizado, com dores de cabeça, que começaram esporadicamente, mas tornaram-se constantes com rapidez. Dessa vez as dores de cabeça intensas e constantes motivaram uma nova consulta. Não de maneira gratuita, claro, com um peso e uma pressão muito grande para Carla. Vou levar você, dizia sua mãe, vou pagar uma consulta, quero ver, nunca vi ninguém para gostar de estar doente como você, mas se não tiver nada, não quero mais ver reclamação de dor de cabeça.
Novamente Carla ficou sem saber se era para ter problema ou não, porque ter problema de visão acarretaria em mais um gasto com óculos, não ter acarretaria em lamúria por ter desperdiçado dinheiro em uma consulta particular. De qualquer forma não tinha como escapar dessa pressão. Carla decidiu deixar nas mãos de Deus (que naquela época acreditava), porque a dor que sentia era real e intensa e motivo para uma nova história. Além do mais, não era totalmente mentira que Carla gostava de ir ao médico, na verdade não gostava especificamente ir ao médico, mas esse era o único motivo que vinham para a cidade e ela amava vir para cidade. Sonhava em morar numa cidade grande, com prédios altos, elevadores, escada rolante e pasmem, com poluição, embora que tinha medo disso, o mundo assustava a Carla.
Chegou a hora da consulta, perguntas, sua mãe respondia todas, ela nem cogitava responder, porque não sabia de nada, menina do interior como era, não sabia como falar com médico. Após as perguntas a temida hora, Carla ainda não sabia se deveria falar as letras conforme tinha decorado ou se deveria falar somente o que via. Decidiu falar o via e via poucas. Ele colocou um aparelho que à ela fazia lembrar uma borboleta e foi passando lentes, magicamente o mundo foi ganhando cores e traços definidos, embora que ela tinha a sensação de que algo puxava seus olhos para fora. Mas as letras passaram a ter forma clara e cor viva. Algo que Clara nunca tinha visto. Se acreditasse em fantasia, certamente imaginaria ser algo mágico. Ele mudando a lente perguntava essa? Ou, voltando a lente anterior Essa?, Ela optava pela lente que achava que via melhor sem arrancar meus olhos. 


Comentou que tinha a sensação de algo puxando os, ele disse que era normal e que ela acostumaria. Receitou o óculos, indicou uma ótica. Carla escondeu o sorriso e vestiu a máscara de desamparo, como era esperado, ter um problema que justificasse o valor gasto na consulta e um fingido incômodo por ter que se adaptar à uma necessidade. O que mais lhe deixara feliz foi a orientação de que deveria voltar a cada seis meses. Pelo menos seria certeza que duas vezes ao ano voltaria à cidade.
Escolheu um óculos entre as opções mais baratas que adequasse ao seu gosto, com um rosa leve, lentes grandes. Ficou feliz, mesmo que tivesse que esconder isso. Era a primeira vez que tinha lembrança de ganhar algo caro, mesmo não sendo tão caro e principalmente porque era a primeira vez que escolhia o que iria usar. Nem acreditava que podia ser tão bom ver várias opções e escolher uma, sem tem que aceitar algo trazido, escolhido, nem sempre ao seu gosto de outro lugar.


2 comentários:

  1. Olha, agora q eu me afeiçoei à Carla, vc me faz o favor de não parar de escrever sobre ela hein! kkkkk

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  2. Pode deixar Lidi, Carla tem muitas histórias, umas tristes outras felizes...

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