segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Uma Saudade




Hoje, dia 28/11 é uma data que me remete a uma reflexão sobre a maior perda que tive. Não são todos os anos que lembro. Porque sou assim, perdida no tempo e espaço e para mim o que tem valor é como me sinto e não que dia é e o que ele deveria representar.
Então me sinto saudosa já faz algum tempo e, quando essa saudade parece que vai me sufocar é o momento de escrever.


 Foi uma morte repentina, sem nenhum tipo de aviso prévio. Mal soube que naquela semana ele não estava se sentindo bem, não sei se isso aconteceu porque era egoísta demais para perceber que havia vida, e logo possível morte ao redor de mim, ou por ser nova demais não mereci créditos para saber o que acontecia na família. Isso não importa, mas incomoda e sempre vem à tona porque não percebi? Teria feito algo diferente?
Talvez a única coisa que tivesse feito diferente teria sido restituir ele de um chocolate que presenteei, ele não comeu e eu acabei comendo dividindo com uma amiga. A culpa dessa gula por vezes me faz pensar. Mas como conheci a essência da alma bondosa dele tenho certeza que não há importância, porque para ele o que tinha valor era o estado de paz que ele gostava de viver. Não permitia ficar aflito por nada e isso por crer que tudo provinha da bondade de Deus. Além de ter uma singular facilidade de deixar o passado no passado. Certamente esse fato não teve pra ele a importância que teve para mim.
Sinto saudade do olhar, jamais vi em outros olhos aquela paz. Sinto saudade da mão calejada do serviço pesado, do cheiro de óleo, da comida que fazia, do café, do tom de voz, dos “causos”, de como se sentia feliz com as coisas simples da vida. Se sentia feliz em poder descansar à sobra de uma árvore, tomar chimarrão, viajar, comer algumas coisas que gostava, gostava de picolé. Gostaria de saber qual era seu sabor favorito, gostaria de saber sua cor favorita. Gostaria, principalmente de compartilhar a mesma fé. Consigo sentir felicidade pura em coisas simples, mas não consigo sentir a mesma fé que ele tinha, e esse era o principal valor que queria nos passar.
Lembro que faz poucos meses que consegui acreditar que dinossauros existiram, mesmo com todos os achado arqueológicos, simplesmente porque um dia ele disse que isso era bobagem, dinossauros não existiram, se tivessem existido, certamente a Bíblia citaria, se não estava na Bíblia, não tinha existido. Então percebi que eu tinha nele a mesma fé que ele tinha na Bíblia. Se ele dissesse algo, para mim aquilo era verdade, total e absoluta. Infelizmente não consegui passar a mesma crença sem questionamentos para Bíblia. Porque sempre fui, desde a mais terna infância (minha irmã me conta) a teimosa, a difícil, isso porque pensava, questionava, duvidava, queria experimentar, e apenas ao meu pai eu respeitava de forma cega, totalmente confiante.
 


Talvez tenha pouco dele em mim, mas tudo o que tenho de valores, de ética, de moral, de caráter, tudo mesmo veio do exemplo do que meu pai foi. Como disse, não tenho a fé que ele tinha, mas me conformo em ter desenvolvido um estilo de vida simples, buscando estar feliz e bem hoje, com o que tenho hoje. Em dizer a cada despedida aos meus filhos que os amo, porque pode ser a última, não que deseje, é claro; pelo contrário, é uma ideia que me desespera, mas por vezes penso nela, porque a vida é efêmera e tudo o que temos é o agora. Quando eu partir quero ter a certeza que a última coisa que disse para as pessoas que amo foi o quanto as amo, e ter sentido delas a recíproca. Esse despreendimento, essa posição de que a vida é fugaz e foi me dada como presente, mas não me pertence totalmente porque não tenho controle, cabe à mim aceitar e ser feliz com o que tenho nela foi um aprendizado que ele me deixou. É necessário explicar que aceitar não é se conformar, o conformismo preguiçoso, onde se pára de sonhar e passa a viver sem perspectiva, não é isso. Mas também não quero me explicar muito.
Hoje quero sentir saudade, escrever por entre lágrimas palavras que não expressam na totalidade, mas amenizam a saudade. Palavras que não representam mais dor, porque consigo visualizar que apesar da pouca convivência ele deixou em mim marcas profundas e brilhantes.




quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Carla e o Psiquiatra




Carla cansou de roer as unhas, comer chocolate, brigar sem motivo, chorar sem entender, dormir descontroladamente e resolveu procurar ajuda. PSIQUIATRA. Porque ela não tinha medo de admitir era louca. Louca, completamente insana, totalmente inadequada nesse mundo de valores deturpados onde se pesa totalmente o ter ao invés de ser.
 Carla buscou ajuda para tentar se enquadrar, viver de maneira mais ignorante e hipócrita como a maioria das pessoas com quem convive e, como elas, fingir publicamente uma felicidade intensa quando na verdade já estão completamente mortas por dentro.




Isso, Carla procurou o médico para morrer por dentro para continuar vivendo por  fora.
Primeira consulta: ele perguntou o que estava acontecendo. Carla ficou pensativa... Acontecendo..... Nada nunca acontecia em sua vida, tudo ela tinha que correr atrás e conquistar..... Respondeu simplesmente: Nada, me sinto um pouco triste, por vezes tenho vontade de chorar sem motivos, sinto muit.....
Ele interrompeu e disse: fluoxetina vai te ajudar, toma um comprimido pela manhã, logo após o café. Mais alguma coisa.
Carla meio decepcionada, tinha pensado que seria como uma terapia, que iria falar, chorar, gastar caixas de lenço, contar a infância triste e amargurada, como isso ainda a acorrentava e a mantinha prisioneira;  foi buscar o remédio. Começou a tomar e realmente se sentiu um pouco melhor.
Na próxima consulta Carla tinha decidido, iria falar, precisava falar. Mas, mais rápido do que a primeira vez Carla estava com a receita em mãos para mais quatro meses. Com indignação trocou de médico.
Primeira consulta, de novo. O médico perguntou sobre as consultas anteriores, Carla respondeu tranquilamente, mas a primeira pergunta de cunho pessoal a desconsertou: Com quem você mora???
Com quem moro??? Ninguém. Ninguém??? Que triste, você deve ser tão amarga, solitária não mora com ninguém, se você morrer a noite será encontrada morta apenas quando no seu trabalho acharem estranho você faltar sem dar notícias por uns dois dias. Se for no final de semana, vixi, já estará em estado adiantado de decomposição. Foi o monólogo que passou rapidamente pela sua cabeça.



Ele chamou Carla à realidade, enfatizando a pergunta. Carla respondeu apenas “eu mora só”, sem todas as angústias que lhe passaram pela cabeça. Depois disso, ela não lembrava ao certo como decorreu a consulta, tinha lembrança apenas dela estar exteriorizando palavras enquanto ele olhava e ouvia com atenção, com certeza deveria ser alguma múltipla personalidade agindo porque Carla só conseguia pensar em “com quem você mora?” e o que isso representava.
Sua personalidade múltipla deveria estar deprimida, porque ele aumentou a dose da fluoxetina, enquanto Carla conseguia apenas pensar.....
Morar só representava tantas coisas, não apenas ruins, mas muitas coisas boas que Carla percebeu que não usufruía. Morar só representa ter autonomia financeira, representa independência, que vem coladinha com responsabilidade e isso bastou para ver o quanto Carla era infantil e imatura, aprisionada por correntes apertadas de um passado que existia presente em sua mente.
Quando planejava viajar ficava com receio de comunicar sua mãe e ter que ouvir dela comentários de como não se deve gastar, isso enchia o saco e fazia Carla se sentir cometendo um erro. Lembrou que da última vez que viajou se sentiu pressionada por si mesma a ligar avisando que estava saindo e que estava tudo bem. É claro, existe uma natural preocupação por ser família, mas não obrigação, como era a maneira que se sentia.
Continuou sua reflexão, há muito tempo Carla sentia vontade de mudar de cidade e estava protelando a decisão. Por que? Simples, porque seria uma ofensa pessoal à sua mãe ela querer viver em outra cidade, com melhores oportunidades. Quanta pressão que ela permitia ter, não era sem motivos que no fim do dia ela sentia que o peso do mundo estava em seus ombros. Não se permitia decidir por si, vivia cobrando um comportamento agradável aos outros e não a sua felicidade.
Foi com um sorriso no rosto que resolveu se despir da obrigação de ser perfeita, agradável, boa, íntegra, correta, responsável para cultivar valores que tenham importância para ela.
Resolveu ser pefeita, agradável, boa, íntegra, correta, responsável e ter valores importantes conforme seu conceito. Assim, descobriu que o psiquiatra realmente ajudava, não só com medicamentos, mas fazendo a pergunta certa, mesmo que sem querer. E que não precisava morrer por dentro, era possível ser feliz na íntegra porque os valores que o mundo não tem, não podem ter maior importância do que se é na essência.





segunda-feira, 21 de novembro de 2011

O Amor




Não me atrevo a tentar definir o amor, não consigo sequer transmitir em palavras o que sinto. Toda  vez que tento, fico reticente, achando que no meu limitado e insignificante vocabulário não há nenhuma palavra que expresse o sentimento sublime que tenho. Essa busca pela definição, ou apenas pela expressão na intensidade real do que sinto me gera uma ansiedade. Uma ansiedade sem sentido, afinal o amor que sinto, só eu sinto e para mim não precisa de definições, pois está na alma, na pele. Mas vejo o outro tentando também definir, expressar, com menos palavras do que eu, é claro, o sentimento que lhe aquece o coração. Me sinto cúmplice porque não consigo saber o que ele sente, como sente, de que maneira sente, mas me entrego ainda assim, de olhos fechados, na confiança de que o que quer que seja que vem dele é tão sincero e intenso quanto o que vem de mim. E a cumplicidade aumenta quando percebo a entrega pura, sincera e desapegada com que abre sua vida para mim. Depois disso, me sinto deusa, deusa do amor, da felicidade intensa, que tem como cúmplice uma alma pura que me ensinou o sentido de ser unidade e amar ao mesmo tempo.