terça-feira, 20 de setembro de 2011

Beijo




Estou sentindo falta de beijo. Não daqueles beijos que esquentam, excitam e deixam o coração descompassado, mas daqueles beijos livre, sem compromissos que vem naturalmente, sem cobranças. Daqueles que se consegue encontrar em uma única boca na vida toda, que por vezes vem com sabor de amor, daqueles que o tempo pára e você pensa que conheceu a eternidade num toque, numa boca. A partir de agora só se observa um suspiro apaixonado de uma adolescente que não consegue esconder que foi pega pelo cupido.


terça-feira, 13 de setembro de 2011

Carla e o Café




Carla sempre soube que café fazia mal, agitava, tirava o sono. Mas ainda assim, desde que Carla tinha lembrança ela gostava e tomava muito café. Ela não podia em nenhuma hipótese ser considerada um ser humano normal, porque café para ela não tirava o sono, não agitava, a única coisa que acontecia era deixar um gosto estranho na boca que lhe incomodava e a empurrava a tomar mais um.
Na vida de Carla o café tinha vários significados especiais e todos a remetiam ao seu pai, falecido. Às vezes gostava de imaginar que seu pai tinha pedido aos céus para ser o seu espírito guia depois que faleceu, gostava de imaginar que era ele quem sussurrava no seu ouvido para embarcar em determinada lotação porque a próxima poderia atrasar, que sussurrava em seu ouvido segredos que as demais pessoas não escutavam, que era ele quem a protegia dos espíritos menos evoluídos que ela atraia por não ser a pessoa mais positiva do mundo. E, café a fazia lembrar do seu pai.




Era seu pai que levantava cedo, colocava a água para esquentar. Quando estava quente, mas não fervente, para não queimar o pó; acrescia três colheres de sopa bem cheias, mexia, desligava o fogo. Algumas vezes uma borra de pó subia pelo gargalo da chaleira, seu pai a chamava para ver, ela lembra de umas duas vezes que isso aconteceu. Depois ele coava em um coador de pano, adoçava e colocava na térmica para tomar o dia todo. Um dia Carla levantou e seu pai estava jogando fora um bule inteirinho de café. Foi um choque para ela, afinal ele sempre tinha ensinado que desperdiçar comida (bebida, água, qualquer coisa) era pecado, e quem pecava ia ao inferno. O coração de Carla disparou, não poderia seu pai, tão bom, ir ao inferno por causa de café. Pai, porque está jogando fora?? E ele respondeu com a calma e ternura tão característica dele: tinha acabado de passar, quando fui adoçar pulou uma perereca de dentro, não sei como aconteceu, ela devia estar no bico, porque lavei antes de arrumar o coador, e café com perereca não dá para tomar, né? Imediatamente Carla se preocupou com a perereca, pai, ela se queimou? Acho que não, ela não é burra, quando começou a esquentar a danada pulou fora, e eu perdi uma passada de café. Bom, para Carla se a perereca não tinha se queimado, não tinha nada de grave acontecendo. Anos depois quando Carla estudou sobre os anfíbios e sua respiração cutânea, que por isso eles têm a pele úmida e sensível, lembrou da perereca, sentiu um pouco mais de piedade dela e achou que para a perereca já tinha dedicado pesar suficiente, procurou ignorar a história dali em diante.




Quando Carla chegou a adolescência, naquela época em que as meninas querem aprender a cozinhar achou que era o momento de aprender a fazer café. Correu até o trabalho do e perguntou: pai, como faço café??? Ele explicou pacientemente que deveria colocar três colheres de pó e seis de açúcar e fazer como já tinha visto ele fazer várias vezes. Teve uma breve recomendação: só cuida para não derramar pó no fogão para sua mãe não ficar nervosa quando chegar, depois me chama que quero tomar também. Naquele dia Carla se sentiu especial, faria algo para seu pai. Estava só em casa, então não precisava esconder a alegria que sentia e tão pouco disfarçar o brilho no olhar. Colocou a quantia de água que já tinha visto seu pai colocar e esperou ansiosa em frente do fogão enquanto a água esquentava. Quando chegou no ponto máximo que seu coração aguentou esperar a água esquentar acrescentou seis colheres de pó, desligou o fogo, procurou no bico da chaleira para ver se tinha formado a borra, não tinha, pensou que quando tivesse a experiência de seu pai conseguiria e começou a passar. Ao terminar adoçou e provou. Estava horrível, amargo, parecia que grudava na língua. Sentiu um leve desespero! Colocou mais várias colheradas de açúcar e provou novamente. Continuava amargo. Seu coração disparou, seus olhos encheram de lágrimas, como poderia oferecer um café desses ao seu pai, não conseguia imaginar o que tinha dado tão errado, mas não tinha escolha, tinha feito alguma cagada e teria que assumir.
Correu ao trabalho do seu pai e disse para ele, tentando com uma força de mulher maravilha não chorar desesperadamente: pai, sei lá o que aconteceu, não fica doce de jeito nenhum... Seu pai olhou para ela com um olhar doce e disse: vamos lá ver. Chegou em casa e provou e falou: Meu Deus, isso é café de colombo! Ela sem entender perguntou: café de colombo? Ele respondeu: sim, forte, muito forte, café de colombo, cada gole um tombo, e deu um sorriso contido. Só então Carla conseguiu relaxar. Perguntou por que não ficava doce e seu pai, antes de responder perguntou quantas colheres de pó ela tinha colocado. Ela disse: seis, oras, como você disse e três de açúcar. Ele respondeu: três de café e seis de açúcar. Ela com um tom de quem tinha finalmente entendido tudo disse: ahhhhhhhhhhhhhh.
A partir daí iniciou uma maratona de ideias de como consertar aquele café sem ter meia dúzia de litros. Não foi fácil, nem ficou bom, mas ficou em segredo. Sua mãe não poderia saber que ela tinha usado seu fogão para fazer café e ainda feito errado, certamente ficaria irritada. Carla que já tinha paixão pelo sabor acrescentou ao gosto tradicional a sensação de cumplicidade.



quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Apatia




Existem dias que são de pura apatia.
Existem feriados que são de pura apatia.
Buscam-se palavras para escrever e não se encontra, os textos ficam pela metade, as comidas perdem o sabor, a ociosidade é preguiçosa e não criativa, não há serviço a fazer, não há programa para assistir, não há música que agrade ao ouvido, nem voz que se queira, não há barulho que arranque sorriso ou arrepio de susto, não há presença que se deseje, não há livro que agrade, não há revista que atraia. Não há nada, é como existir no vácuo, no ponto de singularidade, perde-se a noção de tempo e espaço, se atravessa o corredor em segundos, mas parecem anos, as lembranças correm, as histórias fogem como se não existissem mais. Nem solidão, nem tristeza, nem alegria, nem angústia. Nem vontade de estar só, nem vontade de estar acompanhada. O café não tem o sabor atrativo mesmo estando do jeito que gosto. A água tem gosto de nada, nem de “água”. E, de repente se percebe. Se percebe apático.




Esses momentos são raros para mim, normalmente fico angustiada porque não gosto de passar por eles, gosto de sentir, de pensar, de ter um furacão em mim, essa é minha essência, uma alma cheia de pensamentos e aventuras. É só assim que aprendi a me conhecer, e quando encontro a apatia me torno uma estranha à mim. É estranho não sentir nada. Não sinto saudade, mesmo estando longe do meu amor, não sinto falta do sorriso da Amanda mesmo sendo ele a coisa mais bela que já vi, não sinto falta do olhar doce do Henrique mesmo sendo esse o olhar que mais perto chega da minha alma, que derruba todos os muros que construí para me proteger. Não sei, ao mesmo tempo que sinto tudo isso, porque não escreveria se não sentisse. Mas é um sentir diferente, apático que não exige a presença desses fatores. E, nesse ponto já não me reconheço, sinto uma leve vontade de me embriagar, talvez fumar um abominável cigarro, ou pular de bunjee jump, qualquer coisa que volte a fazer eu ser eu mesma, com toda a minha confusão, com todos meus conflitos, com todas minhas histórias fantasiosas de uma vida, ou várias vidas perfeitas, com todas minhas dúvidas, com todas minhas angústias. Para onde foram? Que vazio estranho é esse em minha mente. Me sinto cega, vejo o mundo com suas cores normais, com seus aspectos normais, não sinto nada especial, nada me atrai. Me sinto surda porque o vento nada mais é do que uma brisa refrescante, não traz sussurros de outros continentes, não carrega confissões e declarações de amor, estalo de beijo, nada, apenas o silêncio e a brisa refrescante. Para onde foram as vozes do vento? O sol não está quente, não causa o ardume característico do horário, para onde foram os raios quentes do sol que dão uma sensação de preguiça gostosa?
Para onde foram minhas ideias? Não encontro. Procuro e só vejo escuridão, as coisas estão organizadas, limpas na minha mente. Devo certamente estar em outra cabeça, porque não reconheço essa como minha, afinal se não há bagunça, tumulto, histórias, saudade, uma lágrima querendo sair para se pendurar na ponta do sorriso, não é definitivamente, minha cabeça. 




Então, feriado, não me reconheço, não vivo, estou passando apenas. Espero que essa apatia seja passageira, porque sinceramente me prefiro com energia, com intensa alegrias, ou tristezas. Com qualquer coisa, desde que seja intensa, desde que haja, qualquer mesmo, que me remeta à pessoa na qual me reconheço.
Hoje senti falta de mim, das minhas esquisitices, das manias, das neuroses, das dúvidas, dos medos, da saudade, das histórias, da minha essência. Hoje me sinto sem alma, pois há em mim uma apatia.



segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Zaluzejo - O Teatro Mágico

Show da Trupe em Cascavel/PR 

Outro dia, porque sou perdida no tempo e espaço, não lembro quando foi, surgiu um comentário no face da trupe O Teatro Mágico, que eu acompanho com orgulho, sobre como se escreve “ansioso”. Fiquei “com a pulga por de trás da orelha” e me perguntando: quantos “ansioso” escrito de maneira incorreta foi lido ao ponto de ser necessário comentar a grafia? Isso vindo de fãs de artistas que compõem música com tanta maestria me assustou, afinal quem acompanha a trupe e suas letras percebe com facilidade o toque genial que há nelas. Após isso, tive um susto ainda maior, onde quem defendia quem tinha escrito errado usava a música Zaluzejo como defesa, principalmente a citação:

“Acredito que errado é aquele que fala correto e não vive o que diz.”

Atualmente temos em nosso país uma educação precária por uma série de fatores, isso chega a ser um clichê, e nessa precariedade educacional tem se formado, inclusive em graduação, pessoas que não conseguem compreender um texto e muito menos escrever certo. Eu tinha um professor que dizia que texto não existe para ser interpretado, mas compreendido, porque se um texto tiver que ser interpretado não foi bem escrito. Partindo dessa premissa fica muito claro que a música não trata de grafia e sim de maneiras de falar. Qualquer pessoa que tenha tido uma educação formal tem noção que alguém que fala como a música exemplifica muito provavelmente não sabe escrever ou escreve precariamente, não frequentou escola, e arrisco por minha conta que não acessa face, twitter e outras redes. Portanto a música como desculpa é apenas uma muleta!


A letra em sua totalidade refere-se aos ditos populares e às palavras que comumente são pronunciadas de maneira errada, em sua grande maioria por pessoas de mais idade e para defender essa forma de comunicação alguns linguistas afirmam “que não há falar (no sentido de pronunciar) errado, mas sim escrever errado”. Por exemplo, eu sou “do interior do interior” e aprendi a pronunciar carro com som de um “r”, ou seja, “caro”. A professora de português dizia que era válido desde que fosse compreendido o que estava sendo dito e escrito de maneira correta. Durante toda a graduação outro Mestre em Língua Portuguesa, Celso, tinha a mesma premissa.
Já faz algum tempo que não frequento nenhuma instituição de ensino formal, mas acompanhando colegas que ainda estudam percebi com grande pavor que há muita dificuldade em escrever correto, bem como a preguiça de acentuar palavras porque o “word” faz isso e que usar termos comuns em redes sociais nos textos formais tornou-se algo constante. Falar correto, até falam, mas escrever não, o que remete novamente à música, afinal não saber escrever o que fala, para mim é como não viver o que diz.
Será que mudando o sistema educacional isso vai melhorar ou é uma questão cultural de uma geração sem muito comprometimento com nada?? Essa é outra pergunta constante quando observo, não só a escrita, mas também o comprometimento profissional da minha geração, mais já é tema para outro texto.

Vou aproveitar e divulgar a trupe porque amo competência com que compõem suas letras.