sexta-feira, 29 de julho de 2011

Bukowski

 
"Me sinto bem em não participar de nada. Me alegra não estar apaixonado e não estar de bem com o mundo. Gosto de me sentir estranho a tudo..."
Li essa citação num face, achei tão amarga e tão hipócrita, que se uma pessoa tem que escrever que se sente bem é porque não se sente tão bem ao ponto de transparecer...
Copiei, colei e passei algum tempo refletindo o que exatamente essa frase me diz. Não consegui pensar em nada que pudesse ser escrito, mas ao mesmo tempo, ela é profunda e revela grande parte da alma de que a citou. Pertence a uma minoria “estranho a tudo”, não se enquadra aos padrões sociais imposto. Logo, certamente passou por algum tipo de preconceito. Isso já é muito para saber de uma pessoa apenas por uma citação.
A expressão da frase, a colocação das ideias têm um “Q” de gênio, mesmo julgando a pessoa que escreveu, é alguém que merece minha admiração. Aliás, atualmente a ignorância é tanta que qualquer pessoa que respeite a língua portuguesa já merece minha admiração.
Continuei olhando pra frase, meio que percebi que ela olhou pra mim, rolou um certo flerte. Me identifiquei um pouco com ela, não que eu não goste de participar de nada, nem me alegro em não estar apaixonada e tão pouco gosto de me sentir estranha a tudo. Mas ainda assim teve uma identificação que não pude entender ao certo.
Não desisti, insisti um pouco mais, li, reli, continuei olhando, por vezes me identificava, por vezes sentia repulsa. O pior é que não conseguia ficar neutra, sem nenhuma sensação. O pior mesmo é que não conseguia simplesmente fechar a janela, ignorar e continuar meu afazeres. Algo mudou dentro de mim, algo foi tocado por essa citação, algo queria exteriorizar uma nova ideia, alguma coisa diferente. Coube a mim escrever buscando sentido para as coisas sem sentidos que estava sentindo.
Mas confesso que não ajudou muito, então resolvi pedir ajuda ao oráculo google. Colei no google, apertei o enter e a primeira coisa que apareceu foi “Charles Bukowski”. Pronto, um alívio enorme surgiu, porque o velho safado era mesmo um gênio com as palavras e qualquer coisa que se leia dele tem realmente o poder de te deixar diferente, não imagino que alguém consiga ficar totalmente neutro lendo Bukowski. Logo minha ansiedade passou, realmente já tinha tido contado com um pouco da obra dele e esse é seu perfil, nos tirar da apatia, se não entende o que passou contigo, não tem problema, o que importa é não ficar isento de sensações diante de palavras fortes. Ele era naturalmente amargo, exteriorizava toda sua acidez em textos memoráveis.
Pronto de novo, tranquila, sabendo a origem da citação, conhecendo o personagem que a citou, não entendendo direito minhas sensações, mas acho que nunca vou conseguir, então natural, conhecendo Bukowski já posso entender o que se passou comigo, fechar a janela e continuar minha rotina sufocante.


quinta-feira, 28 de julho de 2011

Ensaio Sobre a Cegueira




Vi a adaptação para o cinema dessa obra ímpar. Fiquei instigada a ler o livro.
Mas num apanhado geral, porque assistindo uma vez o filme é praticamente impossível assimilar todas as reflexões que ele incita, achei uma metáfora muito interessante.
Privar toda a humanidade de um sentido tão importante quanto a visão é uma ideia inteligente a se explorar e Saramago faz isso com maestria. A composição dos personagens, o fato de não usar nome próprios de me leva a imaginar que cada um deles representa um grupo da sociedade: a dona de casa enfadada com os afazeres domésticos, sem iniciativa que se depara com uma situação de extremo poder e opta pela sensatez; o médico que tenta manter o comportamento ético e moral incentivando a organização dessa fora; a prostituta que desperta o seu lado maternal para cuidar do menino; o “rei” desperta seu lado cruel para ter o poder; o casal oriental, onde a mulher por claramente ser vaidosa tem um impacto maior que os outros com a perda, enquanto o marido tenta reanimá-la fazendo lembrar de bons momentos e ela se recusa porque se entrega totalmente a “desgraça”.
A maneira desesperada como cada um tenta manter os seus valores e como coisas simples como tomar banho, usar o banheiro fazem com que mais que a visão, aos poucos percam também a dignidade. Inseridos num hospício abandonado, sem recursos, com apenas a mulher do médico podendo ver, mas simulando estar cega também passam a viver com recursos limitados. A passagem de tempo é representada pelos detritos e sujeiras acumuladas no corredor, exemplificando também como o espírito dos cegos ficava.


A violência, o abuso sexual só retratavam ainda mais a pobreza de espírito da humanidade. Não costumo ser pessimista, mas é isso que vejo na humanidade, pobreza de espírito, dependência de um “ter” medíocre e temporário e quando se depara com uma situação extrema exterioriza o que tem de mais monstruoso e nojento. Me incluo totalmente nessa “humanidade”, normalmente em situações desesperadoras eu não tenho reações, fico imaginando que numa vivência dessas eu seria aquela inútil que não tem uma ideia interessante para sugerir. E, em nenhuma hipótese abriria mão de um conforto dos meus filhos pelo bem da humanidade. Não consigo ser altruísta, o que me conforma nessa conclusão é que ainda sou uma lagarta a caminho de ser borboleta e consigo ver as mudanças comportamentais como algo natural decorrente do amadurecimento, então nem tudo está perdido, mesmo para mim, mesmo para a humanidade.
Acho que essa foi a sensação ao sair do sanatório e perceber que não haviam guardas: que nem tudo estava perdido, poderiam se adaptar e voltar a viver, cegos, mas ainda assim, viver. Ou melhor, justamente por estar cegos conseguir ter outros valores e então, somente então começar a viver, cada um tinha uma existência, uma história, uma rotina e agora cada passo, mesmo que fosse dentro da rotina seria vivido com outra emoção. Uma das essências da humanidade é não ficar passível diante das calamidades e se adaptar.
Sem rumo o médico convida os companheiros para ficarem na casa dele até conseguirem se organizar, nessa ocasião há a analogia das laranjas estragadas com a alma dos personagens que foi algo interessante para mim, porque é realmente em momentos extremos que nos permitimos ver toda nossa “sujeira”, maldade, incompetência, enfim, nossos defeitos de uma maneira escancarada e que conseguimos ter força para melhorar, enquanto vivemos escondidos por de trás de máscaras mal feitas de bonzinhos nos mantemos estáticos e é preciso coragem para admitir que se tem “alma mofa”.
Por fim, quando a visão retorna ao que ficou cego por primeiro, deixa entender que voltara à todos na mesma ordem, trazendo esperança a eles. Isso nos força a refletir que realmente o ser humano espera sempre algo melhor, mesmo que não faça nada para isso. Acho que é um instinto inato que ajuda na manutenção da espécie.  Natural que após uma vivência assim as pessoas mudem e, natural também o desalento da mulher do médico que foi privada da cegueira e vivenciou visualmente a degradação, enquanto os demais reconstruíam e tinham as experiências no âmbito sensorial, ela viveu visualmente a dor, a imundice, a insignificância do ser humano. Então, quando a visão retornou, ela sentiu que cegava, pois não tinha compartilhado do crescimento moral dos demais.


quarta-feira, 27 de julho de 2011

O Poço



Cais, às vezes, afundas
em teu fosso de silêncio,
em teu abismo de orgulhosa cólera,
e mal consegues
voltar, trazendo restos
do que achaste
pelas profunduras da tua existência.

Meu amor, o que encontras
em teu poço fechado?
Algas, pântanos, rochas?
O que vês, de olhos cegos,
rancorosa e ferida?

Não acharás, amor,
no poço em que cais
o que na altura guardo para ti:
um ramo de jasmins todo orvalhado,
um beijo mais profundo que esse abismo.

Não me temas, não caias
de novo em teu rancor.
Sacode a minha palavra que te veio ferir
e deixa que ela voe pela janela aberta.
Ela voltará a ferir-me
sem que tu a dirijas,
porque foi carregada com um instante duro
e esse instante será desarmado em meu peito.

Radiosa me sorri
se minha boca fere.
Não sou um pastor doce
como em contos de fadas,
mas um lenhador que comparte contigo
terras, vento e espinhos das montanhas.

Dá-me amor, me sorri
e me ajuda a ser bom.
Não te firas em mim, seria inútil,
não me firas a mim porque te feres.

Pablo Neruda


Sem inspiração e com dor de cabeça para produzir, resolvi  buscar conforto numa das poesias favoritas do Pablo, aliás quase todas dele são meus poemas favoritos.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Carla e as Sensações



Carla nasceu e cresceu no interior, foi criada por uma família religiosa que impregnou nela verdades inquestionáveis, histórias pavorosas de como através do pecado se vai ao inferno e como lá é horrível. Caçula de uma família de quatro irmãos não conseguia perceber a verdadeira razão da sua existência, então para ser amada tentou ser perfeita, quando essa perfeição ia totalmente em direção oposta ao seu instinto. Tentou ser religiosa, teve medo do inferno e cansou da frustração, resolveu para não decepcionar o esperado e conquistar o tão desejado amor e admiração dos que ela amava, criar uma falsa Carla, a que ela usava a maior parte do tempo. E tinha preconceitos que estavam no seu íntimo, eram muitos e alguns comportamentos exageradamente corretos.
Ela abominava o cigarro, ficava rabugenta perto de um fumante e reclamava o tempo todo questionando com um certo orgulho como as pessoas se permitiam serem escravizadas pelo vício. Atravessava na faixa, não jogava papel no chão, mastigava chiclete sem açúcar, dormia cedo, evitava bebida alcoólica, baladas, enfim cometer qualquer transgressão. No fundo tudo isso representava uma única coisa: Carla era insegura. Além disso, não sabia exatamente quem era, tinha medo de não conseguir arcar com as consequências, então tentava ser o mais correta possível para ter apenas louros.
Aos poucos ela foi descobrindo que o mundo não ama mais ou menos alguém porque se é correto ou não, na verdade o mundo não ama ninguém, suporta apenas. Claro que foram descobertas doloridas consequência de muitas histórias. Que serão contadas uma a uma sem respeitar ordem cronológica.omens
A humanidade, acreditar no seu futuro ou desacreditar era uma coisa que Carla adorava pensar, julgar intimamente o comportamento dos outros, tinha certeza que na mesma proporção era julgada, então observava e tentava imaginar quais eram as vivências das pessoas que ela apenas via. Algumas despertavam simpatia e outras aversão sem motivo nenhum. Não exteriorizava esses pensamentos, mas permitia que fluíssem livremente. Andava de lotação praticamente todos os dias e em lotações se tem uma infinidade de personagens. Gostava especialmente de sentir os odores, tentar distinguir um do outro. Como achava perfeito a lotação para esses devaneios, muitas foram as vezes que dispersa em pensamentos não desceu no ponto correto.
Numa quinta feira exaustiva quando uma pontada de dor de cabeça anunciava a entrega do corpo para a correria pegou a lotação lotada, chega a ser uma cacofonia, mas em horário de pico lotação é todo “caco” existente, não há porque se preocupar especialmente com o som. Ficou em pé no corredor e foi muito rápido sentir um cheiro enjoativo de perfume ruim. Com consciência de que bom é ruim são critérios relativos, tentou buscar justificativa para o odor: uma pessoa limpa, banho recente ou simplesmente preferência. A dor foi acentuando por causa do cheiro, tentou controlar o instinto e preconceito. Aproveitou que pessoas desceram e procurou um banco. O cheiro persistia, podia notar claramente, era mistura de perfume ruim (lembrando do critério) e sabonete, logo a esse odor juntou um leve odor azedo que lembrou vomitado. A dor intermitente denunciava que essa mistura não era positiva, escutou um bebê resmungar, deduziu que o cheiro azedo provavelmente se tratava de refluxo do bebê, mães de bebês com refluxo cheiram leite azedo mesmo logo depois do banho, coisa incrível. Mães são coisas incríveis.




Positiva Carla esperava que isso melhorasse, três pontos antes de descer, um homem entrou, fez algum comentário ao motorista, o que foi comentado não tem importância, a voz máscula é que instigou os instintos e fez ela mudar o foco, uma distração seria boa num momento em que a cabeça anunciava claramente uma enxaqueca terrível. Poucos segundos após ouvir a voz sentiu o perfume do rapaz, um odor igualmente másculo, que como bom e ruim, também é relativo, mas para especificar, perfume masculino com notas amadeiradas; poderia complementar o másculo com sensual. Resolveu se embriagar do odor, encher as narinas de maneira que ignorasse por completo os odores sentidos até então. Inspirou profundamente enquanto o rapaz se aproximava e intensificava a essência. Foi com surpresa que sentiu a mistura do perfume, misterioso, másculo, sensual com cigarro. De início uma pequena frustração tentou surgir, mas surpresa maior foi sentir prazer com a mistura. Cigarro??? Um cheiro que causava tanto asco. Um arrepiou sensual, um desejo estranho, sensações inexplicáveis e pensamentos em velocidade da luz surgiram, quis guardar fundo na memória a experiência. Deu sinal, desceu e só então percebeu que não olhou para o rapaz. Tinha Agora uma lembrança “odorística” sem face e sem explicações.
Nesse momento percebeu que não seria mais a mesma. Jamais sentiria cheiro de cigarro com repulsa. Foi com naturalidade que na próxima oportunidade que se aproximou de um fumante inspirou profundamente para que a lembrança da fumaça fizesse a lembrança da experiência aflorar. Sentiu uma leve vontade de fumar.





Como não faço apologia ao fumo, Carla é quem teve uma experiência interessante, segue uma advertência:

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Apresentando Carla




Conversando, questionando e refletindo percebi que como eu, muitas pessoas tem ansiedades, dúvidas e questionamentos que parecem pertinentes no momento, mas por medo do papel ridículo, ou da exposição, ou da crítica resolvem calar. Porém, seriam questões interessantes a serem debatidas e que poderiam levar a conclusões que nos tornassem pessoas melhores ou mais críticas, menos influenciável pela massa.
Pensando nisso, pensando em reflexões que gostaria de fazer, ou que foram feitas para mim e não encontrando um meio interessante de escrever, resolvi criar uma personagem chamada Carla.
Carla apenas porque gosto do nome. Pensei em histórias atemporais, não sequenciais, de maneira que possam ser lidas conforme a atração do título, e que possam não ser lidas se o título não atrair, sem impedir que outra seja. Serão assuntos oras triste, oras polêmicos, oras felizes, narrados em terceira pessoa para me eximir da “pessoalidade” serão maneiras de pensar que não refletem necessariamente minhas ideias, mas refletem ideias de alguém que conheço ou que eu acho pertinente colocar em discussão.
Para facilitar Carla não tem descrição física nem idade definida, pode aflorar no seu imaginário conforme vai lendo o texto de maneira natural e pode também ter várias faces, várias idades, pode inclusive ser várias Carlas, mas espero com sinceridade que em algum momento Carla seja você, pode inclusive ser Carlos.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

O Curioso Caso de Benjaminn Button




Assisti esse filme no domingo, por indicação de uma pessoa especial. Confesso que é um título que não atraiu e a sinopse menos ainda. Mesmo com receio, afinal a pessoa que indicou não compartilha do mesmo gosto que eu, resolvi assistir, mesmo não gostando, até o fim. Grande foi minha surpresa que o decorrer da narrativa e a forma como foi desenvolvida me interessou. O filme todo é bom, paradoxal, mas bem interessante, vale a pena assistir. Embora que não quero falar do filme todo, apenas de uma única frase de uma personagem que valeu por todo filme. Ela fala em determinado momento que a gente está sempre esperando alguma coisa para mudar.


Nesse instante eu, sem controle dos pensamentos eu parei o filme para pensar e refletir o porquê de eu não mudar o que me incomoda. Sim, como muitas pessoas me atolo na rotina, sei claramente o que me incomoda e não tenho coragem de mudar.
É engraçado em como me sinto assim antes de qualquer mudança significativa, foi assim quando mudei para kitinete, foi assim quando mudei de serviço, foi assim quando decidi o curso que faria na faculdade e acho que será assim sempre.
E agora sinto uma necessidade crescente em mim de mudar, agora não, já faz um tempo, e pensei que estabilizando raízes com uma casa, um emprego estável esses desejos passariam, se conformariam em refletir através de um novo corte de cabelo, uma nova cor de roupa... Mas me enganei, minha essência é outra, minha alma precisa de intensidade. Eu preciso de loucura para viver.
Por muitas vezes me sinto andando com capacidade de voar e ainda ser boa mãe, aliás mãe de águias e não de pavão, que são lindos aos olhos dos outros mas não desfrutam do melhor benefício de serem pássaros: voar. Essa essência me atormenta, me assusta, na verdade me apavora, mas também não posso deixa-la, afinal seria sufocada pela existência abandonando o sonho da vida.
Tentei por muito tempo me adequar ao que era esperado de mim, mas minha essência é intensa. Quero sentir a adrenalina que acelera meu coração, me faz suar frio. Preciso sentir o vento tocando meu rosto. A liberdade, usufruir intensamente do meu livre arbítrio. E para isso, preciso me livrar das amarras sociais, da culpa por agir pelos meus instintos e finalmente conseguir a maturidade para ignorar as críticas bem como a força para arcar com as consequências, mas arcar sem reclamar, feliz, por saber que o quer que esteja acontecendo foi por opção, atitude e não por me entregar a rotina e me acomodar diante da vida, não por aceitação. Não tenho interesse em assumir a posição de espectadora.
Concluído como me sinto, concluído o que quero passar para meus filhos, basta decidir onde realmente quero estar, fazer um planejamento, pois com filhos, até mesmo as loucuras tem que ser planejadas, e agir. O Agir demanda muita energia, mas isso não é problema para mim.
Devaneios vividos, sonhos anotados, planejamentos iniciados, voltamos ao filme.
Como disse não comentaria o filme todo, mas vale uma observação sobre o personagem principal Benjaminn: era introspectivo e mesmo sendo criança em corpo de idoso tinha maturidade de aceitar sua condição de não ser tão velho quanto parecia. Fico imaginando a dificuldade que é ter tanta energia em um corpo que não acompanha. Por todas essas possibilidades de análises foi um filme que me apaixonou!



Obrigada Davi pela indicação, assisti por ser sugestão sua, de mais ninguém aceitaria uma ideia nada atraente.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

O Amor


Um post bem curtinho, mas não menos importante.

Tanto já foi dito, ainda muito há o que dizer e mesmo sendo redundante não incomoda porque é inédito. O amor é sempre inédito.
Algo difícil de definir, é uma ilusão mas que no fim é real. Como uma alucinação, não existe mas se vive intensamente.


terça-feira, 5 de julho de 2011

Filhos, de novo!




Filhos, de novo, um assunto inesgotável para mim.
Comumente destaca falar da Amandinha, pois claro suas artes se sobre saem, me tiram do sério e me forçam a reflexões despertando o desejo de escrever. Por outro lado, as observações que faço do comportamento do Henrique, são como ele, tímidas, mágicas que despertam em mim um desejo de manter fundo e bem acesas no meu íntimo. Não consigo imaginar tornar público num blog os comentários doces, os olhares curiosos, as milhares de perguntas que por mais que me esforce não consigo responder, os gestos, carinhos e principalmente as vezes em que ele se isola no mundo dele onde toda a mágica existe e vive momentos de puro conto. Isso é muito íntimo e pessoal, mas íntimo e pessoal para ele, faz parte a vida dele, da história dele, que não é de espalhar, nem de chamar a atenção, nem de querer platéia e então espalhar toda essa beleza é quase um insulto à personalidade dele. Em respeito ao jeito discreto de ser do Henrique procuro não publicar suas façanhas.
Mas algumas são inevitáveis.
Ele gosta muito de usar botas, porque no entender dele, heróis usam botas. Ele tem todo um jeito ser altruísta, especial e bondoso de ver o mundo, então ser herói é uma ideia que o fascina, por isso frequentemente ele está em casa com a cueca por cima da calça, bota, uma espada presa na cinta e um fralda amarrada como capa. Aliás, estar em casa é modo de dizer, porque em casa ele só está fisicamente, no fundo ele está em seu castelo vivendo mil aventuras. Esse mundo, mesmo que eu conheço só uma pequena parte, me fascina, me encanta e até me orgulha, afinal tenho o privilégio de conhecer um mundo mágico, especial e único do meu filho por convite do próprio, sem pressão, apenas porque temos uma relação baseada no respeito e no amor, consegui o direito de ir e vir livremente pelo mundo dele, pela vida dele. Isso é algo muito especial, porque quantos são os pais que apenas vivem e educam os filhos, mas nunca conseguiram passagem livre ao mundo deles?
E, claro esse é um caminho de mão dupla, da mesma forma que eu tenho liberdade para entrar no mundo do Henrique e o respeito o suficiente para entender que quando estou no mundo dele, as regras são as dele, deixo meu mundo, sim eu também tenho um mundo mágico, com gramas verdes, sol e praias de portas abertas para ele. Essa troca é maravilhosa. E para mim isso reflete confiança mútua, já tive várias experiências em saber que ele disse muito timidamente coisas pessoais de sua vida, coisas que as mães devem saber, mas jamais saberiam se os filhos não contassem, só para mim, porque confia e sabe que terá a melhor orientação e o que eu disser não será uma repreensão nem uma crítica, será um conselho de alguém que acredita no melhor dele. E também já me senti plenamente à vontade de pedir para ele carinho, abraço, beijo ou para que ele deitasse um pouco comigo porque simplesmente estava triste, carente ou com dor de cabeça, esse gesto que me tira do pedestal de superior e me coloca como humana, com mais experiência, com mais vivência, mas humana, que como ele tem aflições e necessidades e inclusive com um gesto simples de carinho ele pode fazer se sentir melhor.
Foi muito gostoso durante o retorno de São Paulo, onde estávamos eu e ele num banco, o Davi e Amandinha mais no fundo em outro, ele me convidou a ser copiloto, ajudar a cuidar o tempo para que ele pudesse guiar. À princípio pensei que estivéssemos no ônibus mesmo, depois de uma bola fora: “cuidado a pista está escorregadia” descobri que estávamos num foguete ajato “não copiloto, estamos voando muito rápido num foguete ajato, temos que ter cuidado com o furacão que está se formando a nossa frente...” Então embarcada no jato, subi aos céus e voei muitas aventuras até ser chamada à realidade.
Dessas aventuras teria muitas a relatar, mas sinceramente, como já disse, é algo tão íntimo e único, que prefiro deixar entre nós. Mesmo porque, quem não tem um mundo mágico próprio jamais entenderia do que estou falando.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Filhos







Incrível como o ser humano é paradoxo. Como é plenamente possível se sentir simplesmente feliz e meio triste ao mesmo tempo. Isso porque depois de várias noites insones, noites frias inclusive, tive uma excelente noite de sono. Com isso me senti bem, disposta, leve, ativa e feliz. Perfeito, claro que não! Quem tem vida perfeita? A gente só se adapta e aprende a lidar com os transtornos. Li outro dia, não lembro de quem a autoria, que a dor é inevitável, o sofrimento é opcional. Achei interessante, porque mesmo não vivendo uma vida perfeita, é perfeitamente possível ser feliz. Mas vida não se conforma com aprendizados rápidos e insiste. Descobre os pontos fracos da gente e os usa, sem dó nem piedade. Já descobri que isso faz parte do crescimento e do preço que estamos pagando pelos erros no passado, inclusive de outros passados. Então, quanto menor a piedade da vida, maior minha evolução (não sou pokemón, mas evoluo) e, sinceramente espero que menor seja o preço para o futuro.
Para mim, o que se refere especificamente aos meus filhos, atinge em proporções maximizadas. Algo que tento é passar à eles valores sobre respeito, caráter, moral, ética, espiritualidade, certo/errado. Atualmente é difícil conseguir isso com tanta influência da sociedade. De qualquer forma, procuro com os exemplos diários transmitir bons modos. Então algo que me afeta, inclusive mais do que deveria, é mau comportamento. Algo bem inerente da Amanda, que tem na sua natureza o questionamento, a quebra de paradigmas e o desejo de ser notada. Juntando esses fatores a um dia em que a Amanda não estava de muito bom humor o resultado é escândalo digno de cobrar ingresso. Exatamente o que aconteceu no terminal rodoviário e seguiu dentro da lotação até quase chegar em casa. As idosas conseguiram de maneira gratuita assunto para o fim de semana. Os demais um misto de choque com horror que normalmente deixa os espectadores sem ação. Normalmente. Porque nessa ocasião uma espectadora sentiu-se compadecida do “sofrimento” da Amanda e resolveu lhe oferecer um chiclete como meio de acalmar e minimizar os berros. Automaticamente critiquei a mulher, afinal a Amanda, causadora da situação não estava merecendo prêmio. Ainda questionei qual a justiça em ela ganhar doce, enquanto o Henrique, que entrou na circular e foi para seu mundo sossegadinho não ganhava nada. Fiz questão de enfatizar que aquela situação só existia porque minha pequena estava tendo mau comportamento. Acredito que a situação tomou proporções maiores do que a própria Amanda imaginava, meio sem graça ela resolveu pedir algo que poderia ter e se acalmar. Para depois, muito tímida pedir desculpas para mim. Isso tudo antes de chegar em casa. Já em casa o Henrique foi ao banho e eu tive uma conversa com ela, na qual pela enésima vez comprometeu-se em manter o controle.
Só por isso já estava me sentindo bem chateada, meio triste, questionando onde minha postura como mãe estava errada, ou melhor, tão errada. Ainda acredito que apesar de cada crianças ter sua personalidade, eles são reflexo do ambiente. Mas as obrigações domésticas me chamaram à realidade e esses questionamentos ficaram para outra ocasião.
Após uma inteira de sono, algo que até um tempo atrás seria trivial, me senti renovada, feliz. Acordei os pequenos e iniciamos nossa rotina matinal. Na escola, a professora da Amanda perguntou se ela contou o ocorrido ontem. Imaginava que não poderia ser pior do que ocorreu na circular. Pior, provavelmente não foi, mas igualzinho... Ocorreu que a Amanda, querendo ser a segunda da fila simplesmente empurrou a criança que estava no lugar que ela queria ficar. A professora pegou a Amanda pelo braço e colocou no final da fila. O escândalo da vez foi homérico. Segundo a professora, após uma longa conversa a e o aviso de que a próxima vez que isso ocorrer ela ficará de castigo, a Amanda se acalmou. Essa narração me deixou um pouco deslocada, com tanta dedicação para que sejam crianças educadas, não espero perfeição, apenas que sejam crianças, normais, mas acima de tudo educadas. O que piorou a história toda foi a professora lembrar de acrescentar que a minha pequena bateu numa colega porque olhou para ela. Fiquei desolada. Inconformada. Refletindo meu método educacional com a Amanda. Porque com certeza o comportamento dela está bem longe do adequado para viver em sociedade. Para viver em família!
Como não poderia deixar de ser, essa semana foi sem dúvidas a semana da Amanda extravasar e abandonar todo o auto controle que mantém para se adaptar às regras. Foi com desgosto na alma que fui comunicada que por ela ser intransigente e não obedecer a professora foi mandada à sala da diretoria. Para mim essa notícia foi como um soco na boca do estômago, apesar de saber que ela tem muito de mim na sua personalidade, ela me superou nas transgressões. Claro que esse foi o limite máximo que ela poderia atingir esperando compreensão, alguma atitude drástica teria que ser tomada. Diante disso decidi que se ela não se comportasse pelo menos dentro do aceitável, não iria viajar conosco. A partir dessa decisão ter sido colocada para ela e ela tendo plena ciência de que realmente ficaria e eu não sentiria nenhuma pena, o comportamento se transformou magicamente. Numa semana tínhamos uma ogra indomável, na outra uma perfeita princesa ou barbie girl, como ela prefere.
Impossível não observar que para essa transformação acontecer ela estava fazendo um esforço enorme, amarrando a ogra dentro dela. Fazendo um paralelo direto com minha vida tive um momento de piedade, porque eu mesma tenho meus monstros amarrados firmes dentro de mim e sei que isso não é tão bom quanto parece, mas que também não podemos soltá-los livremente mundo afora. E a pequena Amanda terá que ser direcionada com motivação para aprender a manter a ogra acorrentada na medida certa e que há alguns monstros que não são muitos aceitos socialmente, mas podem ser sim soltos.
Com essa conclusão eu preciso aceitar que minha filha, e isso serve também para meu filho, não serão perfeitos, terão vida própria e se forem como eu estarão dispostos a arcar com as consequências para fazer valer o livre arbítrio. E certamente não é fácil para uma mãe/pai imaginar que todo o investimento de amor, carinho, cuidado, doação pode não levar ao destino que esperávamos à eles e isso não pode nos impedir de sermos felizes, porque como eles, temos livre arbítrio e somos unidade, respondemos apenas por nossa felicidade. A nós resta ficar na arquibancada torcendo e orientando para que suas decisões os façam felizes.