sábado, 29 de setembro de 2012

3 Fichas



Esse texto é de autoria de Deivs Mello, mas me inspirou a escrever do ponto de vista da esposa de Filomeno Firmino, seu nome é Creusa... Boa leitura e espero que fiquem curiosos para ver o outro lado da moeda!





Seu Filomeno Firmino acabara de sair de casa sob reclamações de sua esposa tola. Para ele, ela era incapaz de perceber a nobreza e a firmeza de Firmino.  Ela passara a vida toda tentando manter a sua vida limpa, uma metáfora para o modo de como ela mantém os seus poucos móveis e seu imóvel alugado impecavelmente limpo. Pobre esposa ela é, pois ao contrário das novelas que ela tanto gosta, no final as coisas não acabam em casamento, mas em separações e lamentos.


As reclamações eram as de sempre.

1º Aporrinhação

   "È toda noite a mesma coisa,  vai pro bar com aqueles vagabundos encher o rabo de cachaça e jogar aquela porra de friperama."
Acontece que não é todo dia, os jogos são marcados nas terças, quintas, sextas e sábados.
 E é com uma reza  pelo o amor de Deus que ele sempre pede para que ela nunca confunda "friperama" com SINUCA.

   Os seus amigos não são vagabundos, são todos trabalhadores como ele. Destruídos pelo cinismo e frustração conjugal,  depenados pela rotina do cotidiano entediante.

    Há algum tempo atrás quando  seu Filomeno ganhou uma pequena bolada na tele-sena, isso mesmo, aquela do Silvio Santos (e sim, as pessoas ganham de verdade nisso), as coisas pareciam estar boas novamente. Ele havia comprado uma Variant 75 cor pérola. Fazia compras fartas em supermercados. Os vizinhos até comentavam os beijos barulhentos que ele e sua mulher davam em publico.

   Pois foi nesta fase da vida que ele viciou-se em sinuca. Jogava todo dia com seus amigos, porém para sua esposa ele ainda não era um vagabundo cachaceiro.

    Enfim, era uma alegria só, no entanto como todo pobre que nunca viu muito dinheiro na vida ele acabou exagerando nos gastos e esqueceu de investir. Na verdade ele não sabia  investir, ele sabia... Encaçapar.

2º Aporrinhação

   A filha adolescente de 15 anos  que já tinha dado para os homens do bairro todo. Ouvia isso dos cochichos no bar em que frequentava, mas ele já não estava mais ai pra isso.

   Em sua casa Filomeno era o habitual marido inútil. Conseguia consertar uma porta quebrada, algum vazamento,  lâmpadas queimada, videocassetes que engoliam fitas, etc. Mas era incapaz de consertar a beleza, a alegria e o amor outrora tão vívida naquela família.  O cotidiano já tinha se encarregado de encaçapar todos os ingredientes necessários para a difícil relação humana  a longo prazo.

   Filomeno não tinha mais pressa de consertar algo que para ele já não fazia mais sentido.

   Quando o dinheiro se foi, deixando os problemas, Filomeno sofreu, chegou até a vender sua preciosa coleção de vinil do Robertão e do Amado Batista para conseguir uns trocados para jogar sinuca, pois naquela mesa esmeralda ele havia encontrado um novo talento, um novo sentido para a vida.

3º Aporrinhação

   Pode até parecer um clichê, mas a vida dessas pessoas é feita disso mesmo, de muitos clichês de mau gosto.
   Enquanto no bar o limão e a cachaça desciam rasgando pela garganta de seu Filomeno como se fossem Yamahas  YZF-R6 tirando rachas nas BRs, o pó conseguia o mesmo efeito em seu filho de 19 anos que o cheirava em um mocó qualquer.

   Talvez a questão não fosse como Filomeno criou a sua família, mas como cada um individualmente buscou para si o melhor jeito de amenizar tamanha desilusão familiar, tão em voga nos dias de hoje. Cada um buscando em prazeres efêmeros e egoístas a melhor maneira de esconder o fracasso perante uma sociedade que cobra de forma hipócrita diariamente de cada um de nós a vitória quase nunca alcançada.

    Filomeno consagrou-se no dia de hoje campeão de sinuca do seu bairro.

   Para seu Filomeno esta vitória na verdade acaba se tornando vazia dentro desta vida banal, talvez até camuflada dentro das pequenas coisas que acontecem em nossa vida todo dia. O sorriso estampado na cara é um prazer sem alegria de um simples entregador de gás que agora recebia, não dinheiro, não uma nova família, não um novo carro, não uma nova vida, mas sim  um novo item para a sua esposa tirar o pó. Aquela vitória não o tornaria o pai do ano e nem um personagem especial de um programa do Esporte Espetacular.

   Nunca vamos saber o que significou aquela vitória para o seu Filomeno, por que nesse momento estamos concentrados demais atrás de nossas próprias  vitórias tão medíocres, porém tão especial para cada um de nós.

   A vitória de uma batalha na guerra contra o cotidiano na  maioria das vezes não trará nenhuma significância para os filhos, esposas e amigos.

   Amanhã seu Filomeno poderá entregar um botijão de gás em sua casa e lhe dar de brinde um imã de geladeira com uma simpatia  e sorriso raro, mas você não percebera isso, pois , estará ocupado demais planejando  sua própria vitória mesquinha e solitária.

2 comentários:

  1. Muito legal e estou com certeza ansiosa para ver o outro lado da moeda hehehe

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  2. coisas mais triste, mais real e realidade doí, doí...

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